terça-feira, 11 de maio de 2010

O menino que falava pouco


O menino falava pouco. Preferia abrir a boca num riso largo que desabrochava devagar, perfumado. Enfeitando os dias de quem chegasse perto. Curioso, engolia o mundo com o olhar. Rapidinho. Como quem devora um sanduíche bem gostoso.


O menino falava pouco. Diziam por lá que tinha a língua preguiçosa. Suas pernas, ao contrário, eram pura energia. Um descuido do pai e o menino sumia. Um segundo depois ele voltava. Rapidinho. Na velocidade do pensamento. Gostava de subir em árvores,o menino que falava pouco. Prestava atenção em tudo. Fechava os olhos para ouvir melhor. Os pássaros: Bem-te-vi. O vento: veeeemmmmm. O pai: – Vai, filho. Pode subir. Eu estou aqui, bem pertinho! Naquele dia descobriu o rio e quis conversar com os peixes. Imaginava que seria um papo diferente. O pai comprou um barco. Foram juntos pescar uma aventura. E o menino que falava pouco sorriu em silêncio por horas. Paciência, peixes, pai.


De volta à terra, descansaram à sombra de uma mangueira. O sol deitou seu alaranjado no rio e o menino que falava pouco sentiu fome.Um riso lento e largo desabrochou assim que as pernas descobriram o tronco da frondosa árvore. O menino falava pouco. E quando falava, escolhia as palavras como quem escolhe o melhor fruto para matar a fome. Ali, ao desmanchar do dia, pendurado num galho, com a boca cheia de manga e amor, encheu o peito de ar e gritou:


- Você é o melhor pai do mundo.
E o tempo parou num abraço.

O texto acima, de minha autoria, foi publicado originalmente na revista CRESCER, edição de outubro de 2009, e ilustrado pela querida Simone Matias. Você encontra o texto também no site da revista.

Um comentário:

Lígia Pin disse...

Ahhh, que lindo! Lembro desse texto, Tino!
;o)